terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Carnaval


Não suporto a ideia de ser moralista
mas que nenhuma dessas gatas
que bebe todas no carnaval
me apareça grávida amanhã!

Pelo amor de Deus
saibam que do short apertado
cochas bronzeadas
seios estalados
e um rebolado insinuante
repleto de tchan, tchan, tchan
vai acabar em sexo
e algumas gatas barrigudas 
amanhã de manhã...

Hoje não há tristeza
posso rir sem faz de conta
mandar a realidade pro espaço
e seguir o bloco da paixão
mas não deixo que a realidade 
perca de vista 
suas mentiras e verdades
e os tesouros perdidos 
                 da liberade.

É que debaixo de minha cama
tem um bando de ex-amores
que perturbam quem me ama
"E debaixo dessa escrita
tem sangue em vez de tinta
e alguém calado que grita" 
(Affonso Romano de Sant'anna).

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

O carnaval do símbolo - Celso Gutfreind



Não entendia o gosto de meu filho pelo WWE. E meu filho reclamava de minha indiferença. Lembro que ele dizia que essas lutas são de faz-de-conta, e de que sempre os personagens contam uma história. A partir de então, passei a assistir com ele e, no começo, me sentia um pouco sem graça... Agora eu leio este texto do Celso Gutfreind, poeta e psiquiatra, e percebo que o guri tinha razão, e de que tudo faz sentido...

No ano passado, o Ted Boy Marino morreu. Acusei o golpe. Ele foi meu ídolo nos anos 60. Deu-me o direito de ir dormir mais tarde. Eu sonhava acordado com inimigos imaginários. Ele foi o meu primeiro Dom Quixote. Nas lutas do telecatch, eu sorria quando o Ted vencia. E chorava se ele perdia, mas felizmente era raro. Desabei quando “quebraram” o seu braço. Pedi para engessarem o meu também. Eu o imitava dia e noite. Eu e toda a torcida do Flamengo, do Grêmio, do Inter.

Hoje seria como o UFC, com Anderson Silva. Mas não era. Tinha uma diferença. As lutas livres faziam um faz de conta, um “como se”. Até o menino de cinco anos sabia que não eram de verdade. Adultos e crianças, fingíamos juntos. O UFC não põe aspas para quebrar braços, machucar pernas, arrancar pedaços da orelha.

São anos de surra no símbolo. Na brincadeira. Na possibilidade de imaginar. A realidade vem sendo imposta direta demais. Há excesso de videogame e falta de convivência. Lutamos contra o desconhecido; ele pulsa com violência, dentro de nós. Seria mortal, caso não tivesse a festa de consertar. Mas o conserto depende de estar com o outro. Fingindo, brincando, fazendo de conta. Tocando. Da ilusão surge a criatividade. E fica, realmente, mais vivo.

O Mario Quintana falou disso, com poesia. Para ele, o ritmo é salvador. A pele entre o eu e o mundo, entre nós e as coisas. Feita com literatura, mas também com dança, música, cinema, esporte, trabalho. Com encontro. Somos, no fundo, salvos pelo teatro. Somos, no fundo, salvos pelo outro. Caso contrário, a solidão nocauteia com o soco da morte crua e verdadeira, que nos habita desde o nascimento.

O ritual das lutas sabia iludir até que nos sentíssemos prontos para lutar de fato, ou seja, metaforicamente. Crianças encontravam adultos capazes de organizar um espetáculo que representava a violência, mas não era a violência. O UFC cria pouca pele, não cava muito espaço.

Ainda não sei o que farei com a falta do Ted Boy Marino, mas aprendi a esperar. A descansar no símbolo e ficar triste à vontade sem que a realidade venha quebrar o braço, machucar a perna, danificar o cérebro. E, sobretudo, matar o coração.

Acho que vou contá-la, achar um ouvinte, estar junto até que a dor passe para eu poder ficar sozinho novamente. Atado à morte do Ted, há um fio comprido de mortos, do cão à irmã. Dos amigos de Porto Alegre a Santa Maria. Não posso deletá-los simplesmente. Sem ombro onde se apoiar, sem ter com quem falar, não haveria como sobreviver.

O faz de conta acompanhado ensinou a viver de verdade. A morrer, talvez. A prosseguir e, como se espantou o Quintana, vir à tona de todos os naufrágios. 


Zero Hora, 09/02/2013

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

O maluco do bairro

Para que a paranoia
de correr pra ser feliz
se tenho um enluarado
início de abril
e um amigo maluco
que namora a verdade
e vive por um triz?
Que preferiu 
divorciar-se
do prozac
enfermeira e psiquiatra
e casar-se com a cachaça
diária e sistemática?
E não é que o amalucado
é chefe de uma matilha 
de cães adotados
vigias do meu bairro?
Será que o maluco sou eu
que acha tudo isso engraçado??

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Quem precisa de regras de etiqueta? - Cintia Moscovich


Nesse último domingo, 3 de fevereiro, em sua coluna na revista Donna, Celia Ribeiro conta que uma leitora enviou um e-mail discordando de um comentário feito em edição passada, segundo o qual seria invasivo tomar a iniciativa de beijar uma pessoa pública. Para a leitora, não é errado que fãs desconhecidas beijem e abracem atrizes, porque, segundo argumenta, tais pessoas dependem de seu público. Diz mais: que imagina que Celia viva “rigidamente” pautada pelas regras de etiqueta e que “seria bem mais feliz se não o fizesse”.

Ao ler o texto, me veio uma sensação de estranhamento muito grande. Primeiro, porque acho de última se pendurar no pescoço de um estranho, famoso ou não – ainda mais com aqueles gritinhos e fotos de celular. Segundo, porque até as pedras da rua sabem que Celia Ribeiro é nossa maior referência em se tratando do convívio em sociedade, sempre defendendo que as regras de etiqueta são meios de respeitar o próximo e de com ele viver em harmonia. Terceiro, porque achei de uma grosseria sem tamanho a observação de que Celia “seria bem mais feliz” se deixasse de, presumivelmente, “seguir rigidamente” a etiqueta – como se a leitora soubesse de que maneira vive ou deixa de viver a jornalista.

Com o devido respeito, mas essa mensagem da leitora é um legítimo exemplar do sem-noção total, triste produto da inversão de valores que temos vivido. Partindo de um anonimato absoluto, na tentativa de conseguir um mínimo de atenção, as pessoas se veem no direito de emitir juízos de valor e de prescrever receitas de felicidade que mais são desaforo do que legítima preocupação com o outro.

Nesta época em que todos se expõem todo o tempo e no qual as pessoas se julgam felizes porque podem sair beijando atrizes, o complicador das relações é todo mundo ter opiniões formadíssimas sobre todas as coisas, superficiais e raivosas o suficiente para se afinar com a cartilha do politicamente correto. É um tal de falar sem conhecimento de causa, de ser contra sem saber o contrário, de não gostar sem ter sequer provado, situações que são tão legítimas e boas quanto um maestro de orquestra só saber música de ouvido. 


Para agravar a situação, nas redes sociais os disparates são compartilhados milhares de vezes e em meio segundo já se tem consenso universal. Não bastasse seguir o fluxo sem nem olhar para o lado (ah, a vocação de manada!) e dizer amém para palpites os mais abobados possíveis, parece que há também um desprezo pela forma máxima de autoridade, que é aquela conquistada pela via do estudo, da experiência e da sensibilidade, como o caso exposto acima. O tempo me demonstrou que boas maneiras não são futilidade, que a alma se sente bem com um pouquinho de civilização e que beijos e abraços devem ser guardados para os íntimos.

Zero Hora, quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Preciso me apaixonar


Preciso me apaixonar
para começar outros
noventa minutos
de pulsão rolando,
sem minuto de silêncio
e homenagens ao amor
que evaporou.

Sei, no primeiro 
                   tempo
noventa por cento
será por conta
da imaginação...

Sei, não devo prever a morte
desse amor agora, antes de
entrar em campo, sem ter
acabado a fase 
do deslumbramento.

Sei, será difícil conter-me
da vontade fugitiva
toda vez que eu pensar
no castigo que terei
da dor e do rancor
de toda falta de amor
de alguma Diva.

O crepúsculo de Van Gogh

As nuvens eram criaturas selvagens e ‒ ao mesmo tempo ‒ gatos, cães, jacarés e lagartos, perfilados no horizonte próximo. piscaram...