quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Teu nome


Já pensei de tudo
turbinei meus bytes
perdi minha fome
e ainda assim não consigo 
             lembrar teu nome.

A operação de minha memória 
não apagou nenhum dado
apenas o teu nome.

Daqui, dali, como um robô 
a bambolear perdido,
consulto meus arquivos
e nada de lembrar
esse teu nome bandido!

Já me sinto culpado
por apreciar detalhes do teu
                                   corpo
por me apegar ao teu sorriso
tua roupa quilometricamente justa
         e softwaremente sensual.

Já me sinto culpado
por ser digno de tua presença
mesmo que na tela do monitor
numa curtida em tua cara 
de fotoshop no facebook...

Já me sinto culpado
por querer me aventurar 
na conquista
sem ao menos saber 
como te chamar.

Quanto mais penso 
                em você
mais medo tenho
da ciber presença
de um vírus
que te deleta
do meu pendrive.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Barulhos - Ferreira Gular




Disse certa vez que dei o azar de nascer na época da caixa de som. Sim, porque, antigamente, até os meus 21 anos, quando vivia em São Luís do Maranhão, o barulho que eu mais ouvia era do vento na copa das mangueiras e dos coqueiros, um rumorejar constante que atravessava as manhãs e as tardes iluminadas de sol e que era o som do dia, como há o som das cachoeiras. O dia jorrando.
Pois bem, isso talvez explique minha intolerância com os barulhos de hoje, que excedem o nível de decibéis que meus ouvidos toleram. E, embora se fale da necessidade de reduzir a poluição sonora, o que observo é a intenção deliberada de aumentá-la.
Senão, vejamos: que tráfego nas ruas entupidas de veículos provoque barulho é inevitável, mas o mesmo não se pode dizer do rock a soar dentro do supermercado ou no restaurante do hotel às 7h. Essa música tornou-se uma praga que nos persegue por todos os lugares, porque se descobriu que todos nós adoramos música jovem e queremos ouvi-la em todos os momentos da vida e em todos os lugares.
Enquanto as autoridades dizem tomar medidas para evitar a poluição sonora, na prática, o que percebo é uma guerra ao silêncio. E, como o silêncio induz a pensar, tendo a concluir que essa barulheira deliberada é para fugir à reflexão. Trata-se de uma sociedade que prefere se atordoar a se conhecer. O que coincide com os interesses da publicidade comercial, que, como se sabe, quer nos levar a consumir a qualquer preço, ou seja, sem pensar nos juros que desabarão sobre nossa cabeça.
Mas, afora isso, há os evangélicos e, agora, certas igrejas católicas que travam com aqueles uma ruidosa disputa de público, cada qual berrando mais alto do que o outro. É verdade que os católicos pregam menos que os evangélicos, mas, em compensação, se acham no direito de invadir nossa privacidade, de nos impedir de ler, de ouvir a música que queremos ouvir ou de simplesmente ficar no silêncio de nosso recolhimento.
Os evangélicos vão para as praças com seus alto-falantes e ali ficam a gritar citações bíblicas e a nos ameaçar com o fogo do Inferno. No caso da Igreja Católica, citarei dois exemplos de abuso: o de uma igreja no Flamengo que transmite para a rua todas as missas e cantorias do dia a partir das 6h; o outro é uma igreja nas Laranjeiras, com um alto-falante poderosíssimo no alto da torre, que, à hora do Ângelus, irradia a "Ave-Maria" de Gonod numa altura tal que leva a vizinhança às raias do desespero.
Tanto num caso como noutro, moradores foram pedir ao pároco que reduzisse o volume dos alto-falantes e receberam a seguinte resposta: "Pessoas que fazem tal pedido só podem ser inimigas da religião". Claro, quem fala em nome de Deus tem sempre razão e tudo pode fazer para o bem pecador, ainda que este não concorde com a ajuda.
Mas há também quem atue em nome do bem comum e, por essa razão, se sinta também com o direito de nos atormentar. Cito um exemplo: haverá barulho mais insuportável que o das sirenes dos caminhões do Corpo de Bombeiros, dos carros da polícia e das ambulâncias? Não resta dúvida de que devemos todos dar passagem a eles, porque um minuto que percam pode significar a perda de muitas vidas humanas. Mas não precisam de sirenes tão desesperadoramente altas a produzir emissões acústicas que ameaçam perfurar nossos tímpanos. E tudo porque uma empresa inventou um tipo de sirenes mais poderoso do que aqueles antigos e muito mais caros. Certa ocasião, ia eu no meu carro quando, de repente, logo atrás de mim, soou um silvado atordoante, que quase me fez jogar o carro contra um outro ao meu lado. Era uma ambulância.
E quando você descobre que, sob seu quarto de dormir, existe uma boate? Isso aconteceu comigo faz muitos anos, ao me mudar de Ipanema para Copacabana. Só então entendi por que o apartamento estava tão barato.
Passado os primeiros instantes de perplexidade ("Estou ferrado! Como é que não procurei ver o que havia embaixo do apartamento?"), desci até a rua, entrei na boate e pedi para falar com o responsável. Expliquei-lhe que meu quarto de dormir ficava exatamente em cima de sua boate e que, com o som naquela altura, não podia dormir. Ele respondeu que, se abaixasse o som, os fregueses iriam embora. "Mas eu é que não posso ficar sem dormir", repliquei indignado.
- Então vá se queixar à polícia, respondeu-me ele.
No dia seguinte, ao comentar o ocorrido com a síndica do prédio, ouvi dela que o dono da boate, além do mais, era ingrato, uma vez que a chave de luz de sua casa de shows ficava em nosso edifício. Eu mal acreditei no que ouvira.
- Ah, é? Então o problema está resolvido, disse-lhe eu.
Naquela noite, quando a música da boate começou, eu fui até a caixa de luz e desliguei a chave da boate. Logo o sujeito apareceu à porta do edifício e pediu ao porteiro para deixá-lo entrar, pois o fusível de sua boate certamente queimara. Apresentei-me diante dele e disse que não se tratava disso: eu é que desligara a luz. O homem, agora conciliador, pediu-me que religasse a corrente, pois a boate estava cheia de fregueses.
- Vá se queixar à polícia, respondi eu, gloriosamente.
Acontece que o tal sujeito era da polícia.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

(Tirada) de um banheiro de bar


Favor
não        luz
     desligar
acertar     se     não
            o vaso          em
pé                  sente

domingo, 28 de outubro de 2012

Esperança


Viver sem esperança
é como ter casa sem janela...
É por isso que eu arrasto asa 
pro lado dela...
(Da esperança, é claro!)

Sem medo de amadurecer - Martha Medeiros


Estará chegando em breve às livrarias a nova obra do filósofo argentino Sergio Sinay, cujo título é A Sociedade que Não Quer Crescer. Tema bastante atual e que merece atenção. Não há alarmismo em afirmar que viramos uma sociedade de adolescentes vitalícios, todos preocupados em manter a juventude até os 80 anos.

Uma coisa é praticar esportes e exercícios físicos, proteger a pele, se alimentar bem, manter cuidados para garantir a saúde, investir em lazer. Outra bem diferente é se comportar de forma irresponsável, não assumir autoridade, não dar um rumo à própria vida, viver encostado nos parentes. Há quem considere mais cômodo ser criança para sempre.

De fato, é. Temos por aí uma quantidade absurda de crianções e criançonas de 40 anos, de 50 anos, até mais. O que esperar de seus descendentes?

Não é fácil lidar com desejos, fazer escolhas, sustentar decisões. Nos momentos de aperto, gostaríamos de não precisar enfrentar coisa alguma e chamar um “adulto” para resolver as questões sérias em nosso lugar. Porém, não temos mais cinco anos.

Nem 15. Não há mais justificativa para desrespeitar as leis, dirigir de forma inconsequente, se embebedar, fugir aos compromissos. Essa rebeldia juvenil até possui um certo romantismo, é a porção James Dean de cada um. Só que o ator não viveu o suficiente para virar um homem, mas você, sim.

Amadurecer é respeitar os ciclos da vida e deixar a adolescência para trás a fim de assumir seu lugar no mundo. O que não significa virar um adulto chato e prepotente. É permitido divertir-se na maturidade. Muito, inclusive. Adultos curtem a vida mais do que a garotada justamente porque não estão mais testando limites, já viraram essa página. O que fragiliza a sociedade são pessoas que, uma vez crescidas em estatura, não cresceram emocionalmente.

Um adulto de verdade é aquele que não age em busca de uma recompensa – ele faz o que tem que fazer porque é o certo.

Pra chegar a esse encontro saudável com o dever moral, é preciso que ele tenha consciência de quem é, de tudo o que viveu, de como suas experiências o moldaram, e adote uma atitude firme diante de seus filhos, de seus pares, da sociedade toda. Se considerar que isso significa “envelhecer”, que pena: seguirá sendo um garoto mimado, uma garota bobinha, sem brio para herdar o bastão de seus pais e sem consistência para passar o bastão adiante.

Pessoas maduras também têm incertezas, vacilam, fraquejam. Porém sabem a hora de cortar o laço com suas carências infantis e de interagir com o mundo a fim de torná-lo melhor, mais digno.

São agentes de transformação, e não de estagnação. Quando se tornarem idosos, poderão olhar pra trás com a consciência de ter dado um sentido à sua vida, em vez de terem percorrido anos e anos inúteis, acreditando que poderiam ser jovens para sempre só pelo fato de andarem com a aba do boné virada pra trás.

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...