segunda-feira, 16 de julho de 2012

Meu amor criou asas

Como a inspiração se mandou, talvez pela falta de tempo dedicado a ela, por tanto trabalho e novas perspectivas, então vamos continuar com a série "poemas adolescentes fora da pasta".



Coitadinho do meu amor
pintou um baixinho e o levou
alguém ficou sozinho e chorou
alguém se achou panaca e sofreu.

Coitadinho do meu amor
quis ganhar asas mas não deu
sonhou, se iludiu e não deu
um baixinho o levou...

A noite não tem culpa
se meu amor despencou

o frio dessa madrugada
tudo sabe do meu amor.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Livro, um alvará de soltura - Martha Medeiros


O livro é a vista panorâmica que o presídio não tem, a viagem pelo mundo que o presídio impede.Costumo brincar que, para conseguir ler todos os livros que me enviam, só se eu pegasse uma prisão perpétua. Pois é de estranhar que, habituada a fazer essa conexão entre isolamento e livros, tenha me passado despercebida a matéria que saiu semana passada em Zero Hora (da qual fui gentilmente alertada pela leitora Claudia) de que os detentos de penitenciárias federais que se dedicarem à leitura de obras literárias, clássicas, científicas ou filosóficas poderão ter suas penas reduzidas.


A cada publicação lida, a pena será diminuída em quatro dias, de acordo com a Portaria 276 do Departamento Penitenciário Nacional (Depen). No total, a redução poderá chegar a 48 dias em um ano, com a leitura de até 12 livros. Para provar que leu mesmo, o detento terá que elaborar uma resenha que será analisada por uma comissão de especialistas em assistência penitenciária.


A ideia é muito boa, então, por favor, não compliquem. Não exijam resenha (eles lá sabem o que é resenha?) nem nada assim inibidor. Peçam apenas que o sujeito, em poucas linhas, descreva o que sentiu ao ler o livro, se houve identificação com algum personagem, algo simples, só para confirmar a leitura. Não ameacem o pobre coitado com palavras difíceis, ou ele preferirá ficar encarcerado para sempre.


Há presos dentro e fora das cadeias. Muitos adolescentes estão presos a maquininhas tecnológicas que facilitam sua conexão com os amigos, mas não sua conexão consigo mesmo. Adultos estão presos a telenovelas e reality shows, quando poderiam estar investindo seu tempo em algo muito mais libertador. Milhares de pessoas acreditam que ler é difícil, ler é chato, ler dá sono, e com isso atrasam seu desenvolvimento, atrofiam suas ideias, dão de comer a seus preconceitos, sem imaginar o quanto a leitura os libertaria dessa vida estreita.


Ler civiliza.


Essa boa notícia sobre atenuação de pena é praticamente uma metáfora. Leitura = liberdade ao alcance. Não é preciso ser um criminoso para estar preso. O que não falta é gente confinada na ignorância, sem saber como escrever corretamente as palavras, como se vive em outras culturas, como deixar o pensamento voar. O livro é um passaporte para um universo irrestrito. O livro é a vista panorâmica que o presídio não tem, a viagem pelo mundo que o presídio impede. O livro transporta, transcende, tira você de onde você está.


Por receber uma quantidade inquietante de livros, e sem ter onde guardá-los todos, costumo fazer doações com frequência para escolas e bibliotecas. Está decidido: o próximo lote será para um presídio, é só escrever para o e-mail publicado nesta coluna. Que se cumpram as penas, mas que se deixe a imaginação solta.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Catar feijão



Desejei reciclar as teorias que azucrinam as dores do mundo. 
Tantos resíduos acumulados (livros, tratados), quis transformá-los em poesia.
Não tive sucesso, óbvio, nem na arte, nem na política.
Feito traça, agora eu devoro punhados de literatura - válvulas de escape e porta dos fundos.
A vida ficou torta, rejeitamos as saídas mais simples e usamos as saídas de emergência.
Alguém dirá que isso se deve às paixões que temos pela vida, e nos afobamos.
Mas as paixões cansam suas chamas, e uma brisa qualquer as pode murchar...

O baú de minhas histórias e paixões anda repleto de bilhetinhos que mostram o quanto remei e remei, tramei frases e fases, e me repeti - nem precisou ouvi-lo da terapêuta.
Mas eu achei graça quando senti a verdade escorrer suave de seus lábios, e fez cócegas em meus ouvidos como um colibri agitado.
Ao voltar para  a rua, após cada nova (e última sessão), a vida ganhava bis de um poeta romântico e esperançoso.
Poeta em catarse, que acreditava estar próximo da solução de suas nóias, e assim pronto para ser a Madre Tereza do mundo.
Agora, o que me assusta em vertigem é ver que minhas histórias -  do avesso ou mal contadas - desejam fazer escola (e história). Pior, histórias precipitadas, a dever sofisticação no miolo do verbo, tudo por causa da pressa para ter ao redor dezenas de ouvidos.

Então, amanheci militante das causas mais urgentes: separo todo o lixo do que foi dito e mal dito. E, inspirado em João Cabral de Melo Neto, reciclo toda a palavra que pode servir de indigesto alimento. 
(Confesso, minha dificuldade é perceber qual é a palavra certa no momento certo do seu desvelamento...).
Pelo sim, pelo não, dou a palavra ao poeta João, para que me ajude a escolher palavras, a catar esse feijão.

Catar feijão

Catar feijão se limita a escrever:
jogam-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.

Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a com o risco.

domingo, 24 de junho de 2012

Canções da rua

Me chamas contraditório, e com razão. Me detenho para dizer que não precisamos falar muito, precisamos agora ouvir.
Queremos roubar todo o tempo do mundo para que ouçam nossos lamurios, que não digam nada, apenas “sim”.
Minhas canções noturnas são retalhos do caos diurno, nada mais do que canções que ninguém vai escutar. São meus sonhos mais ridículos em busca da redenção.
Falta vontade a nossos ouvidos, falta despertador no coração. Falta cantar a rua, sentir a lua, lembrar todos os dias do pôr-do-sol.
Sou contraditório porque não consigo te escutar, apenas quero ser ouvido, nesses meus gritos de terror. As batidas são estrelas noturnas, no velho ritmo que pede amor.
Em minha rede de verão pretendo mudar o mundo. Daqui eu me divirto, dissertando sobre o riso e a dor. Falo do silêncio enquanto grito, tudo quero escutar com meu tambor.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Isto é um poema - Jean-Pierre Siméon


Um poema
É quando a gente sente o céu na boca,
é quente como um pão
que se come e nunca termina.

Um poema
é quando a gente escuta
bater o coração das pedras,
quando as palavras batem asas,
é uma canção na prisão.

Um poema
são palavras de ponta-cabeça
e, opa!, o mundo fica novo.

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...