sexta-feira, 2 de outubro de 2009

AS SEM-RAZÕES DO AMOR - Carlos Drummond de Andrade


Eu te amo porque te amo.

Não precisas ser amante

e nem sempre sabes sê-lo.

Eu te amo porque te amo.

Amor é estado de graça

e com amor não se paga.


Amor é dado de graça

é semeado no vento,

na cachoeira, no eclipse.

Amor foge a dicionários

e a regulamentos vários.


Eu te amo porque não amo

bastante ou demais a mim.

Porque amor não se troca,

não se conjuga nem se ama.

Porque amor é amor a nada,

feliz e forte em si mesmo.


Amor é primo da morte,

e da morte vencedor,

por mais que o matem (e matam)

a cada instante o amor.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

FRANKENSTEIN



Pode ser esquisito

enxerto

e broto

milagrosamente

concebido

dos becos

e esgotos


é livre

farrapo

e, por ser livre,

compreende as vozes

de todos os bichos...


Não sou Frankenstein:

sou monstro hurbano

de garras afiadas

e ouvidos alongados

por tantos sons estranhos...


Nem o fundo do mar

compreende a minha voz!

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

PRA DESPERTAR A MANHÃ



Numa folha dobrada, sobre a mesinha de centro da sala de espera, estava escrito:


PRA DESPERTAR A MANHÃ


Até quando vou deixar que os outros decidam por mim?

Sei que sou responsável pelo que faço, mas alguma força maior do que eu entra em jogo... Falta indignação e força de vontade de minha parte?

Não tenho certeza sobre o dia de amanhã. Mas o que serei depende, em boa medida, das decisões que tomar aqui e agora.

Deve-se aprender a conviver com o inesperado.


Mesmo num mundo de incertezas, não tem como fugir destas questões:


-saber qual o melhor momento para agir.


-decidir o que é mais importante.


- saber qual a coisa certa a ser feita.


Acabo de ler a mensagem manuscrita que encontrara, e percebo que as preocupações de quem escreveu são também as minhas preocupações.


sexta-feira, 25 de setembro de 2009

VAMOS APRENDER A ANDAR DE BICICLETA



As coisas vão de mal a pior

você se sente sozinho

cercado de lobos insensíveis.


Você olha para o céu

e nenhuma estrela aponta o caminho.


Nessa hora, precisamos captar uma energia invisível

que está em todo o lugar - mas que não se oferece assim no mais...


Organizar os pensamentos, mesmo que, no limite,

temos à mão apenas uma folha em branco do velho diário,

abandonado em algum instante do passado.

Rabiscarmos palavras, frases, pode ajudar a organizar

o mapa de nossos agitados pensamentos.


Esse é o processo.

Nisso eu acredito.

Minha religião é a do inesperado,

do imprevisível e inusitado

- e por que não mesmo do surreal?


Não vamos tremer, se de novo voltamos a ser aquela criança

que pedalou, pela primeira vez, a bicicleta, sem qualquer proteção. Tínhamos que ir em frente, senão cairíamos e nos machucaríamos.

Vencemos o medo, domamos a bicicleta, e tudo se normalizou.

Agora estamos crescidos.

Os desafios são outros.

Se vencemos o medo uma vez,

num mundo totalmente estranho,

habitado por bruxas e monstros,

podemos agora aprender a encontrar

outras maneiras de espantar o medo.


Acho que é pra isso que escrevo.


Minha bicicleta perdeu o freio,

e eu tenho medo de parar e levar um tombo.


quinta-feira, 24 de setembro de 2009

POEMINHA NA GARRAFA - José de Castro



Poeminha na garrafa

foi lançado para o mar.

Longe vai este meu verso

na espuma a velejar...


Poeminha na garrafa,

meu amor vai procurar.

Sopra o vento, fura a onda,

não se deixe afundar...


Poeminha na garrafa

veio um peixe espiar...

Curioso, bica o vidro,

cuidado, pode quebrar...


Poeminha na garrafa,

tem alguém a esperar?

Chega logo ao destino:

“Para sempre vou te amar.”


O crepúsculo de Van Gogh

As nuvens eram criaturas selvagens e ‒ ao mesmo tempo ‒ gatos, cães, jacarés e lagartos, perfilados no horizonte próximo. piscaram...