quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

IMIGRANTE E PASSAGEIRO - canto a Ijuí






A janela do ônibus
é o espelho, olho e o braço
para as ruas, casas e passeios
estenderem a mão.

A janela mostra
tantas coisas
para quem deseja ver!

Em Ijuí há ruazinhas
de muitos desconhecidas
e casas antigas
que foram abandonadas
pelos fantasmas...
Eles dizem que há mistérios
que assoviam no amanhecer!



Como é possível
ser passageiro
que tudo olha
e nada vê?

Vizinhos se ignoram
e constroem
torres de babel.
Nas horas de folga
não relaxam e derramam
seu olhar cítrico
a quem ousa comer
a fruta no pé!



Como é possível
ser passageiro
que se perde
no labirinto
do presente?

Da janela do ônibus,
no início da manhã,
meu Irmão vem cochichar:
- Quem, em Ijuí,
acorda mais cedo?
Para alguns é o leiteiro
para outros o jornaleiro...
Mas ele sabe que não é nenhum dos dois...

São os galos e os passarinhos!

Que não confiam na mecânica
dos relógios de parede
e prestam, com sua garganta,
sonoros serviços
à comunidade!

Seus primeiros cantos assustam.
Mas, aos poucos,
seguimos o caminho.

Nessas viagens,
a trabalho e a passeio,
freamos as batidas
do coração!



A cidade nos pertence
e invade os sentidos
sem marcar hora e lugar!
A cidade salpica nossa vida
como chuva torrencial!

Os solavancos das ruas
são as pedras no caminho
que desviam nossos olhos
de tantos outros espinhos.

Na parada ou no ônibus
há todo tipo de gente,
cores, idades, gestos diferentes...

Burburinhos da catraca...
Quem sabe o que a vida
tira ou empresta?
Deficientes e gestantes,
velhos e crianças,
e suas manobras na roleta!

Ao lado da janela do ônibus,
o guri, desconfiado,
ousa perguntar:
- O que faço, nesta hora, neste lugar?
E no mesmo instante, responde:
- O que importa é que vejo!

O tio cochila na sacada
alheio aos burburinhos
a mãe retorna ao lar
com a criança dormindo!

Trocas, despedidas nas esquinas
beijos, abraços, acenos.
Cada qual se liberta ou se ajusta
à rotina conquistada...


A criança da vila distante
concentrada em seu brinquedo
lambuza-se na terra, alheia aos perigos...

Às vezes nos distraímos e esquecemos
que mais cidades existem
e têm seus riscos!

Há os itinerários do ônibus
Centro – Glória – Boa vista
e nossa sina de estrangeiros.




Nada pode mudar
nossa geografia
nada vai apagar nosso rastro...
Obras, exemplos, sorrisos,
abraços, gestos, acenos...

A maquiagem da cidade
é construção mal acabada:
o reboco das paredes
e o piso das calçadas
parecem pedintes
que estendem o chapéu!

Minha cidade tem dinossauros
que dizem ser quebra-molas
e tem bichos do mato
que dizem ser motoristas!
E muitos correm, tropeçam,
se iludem a trapacear a vida!

Tem vândalos e boêmios
e namorados nas praças
tem pedestres distraídos
nas faixas de segurança!

E na segunda parte da vida
colhemos a alma desgastada
e o extrato de dilemas
são os atos e palavras!
Nos tornamos poetas
para prestar contas
a Deus...
Confusos esquecemos
que o sentido pra vida
nos aguarda nas esquinas.
Perdemos de vista
a saída do curral!

Tem namorados nas praças
vândalos e boêmios
tem faixas de segurança
e pedestres distraídos!...

Hoje o mapa da cidade
não reservou lugar
para a paisagem
de tempos atrás!


A cidade inchou e cercou
lavouras e potreiros...
Mas não estancou
de nossa alma
O sangue de colonos!

E assim marcamos encontros
nos armazéns e casas coloniais
e nos empanturramos de queijo,
polenta, chope e vinho...
trapaceamos as contas
de nossos ancestrais!

Alguns sítios e terrenos resistem
com seus pomares e milharais
e a cidade encurrala
cavalos, vacas e bois!


As crianças florescem
como a espiga bonecando,
na escola, nos pátios, na calçada,
sedentas do sol e da chuva de verão!

E o guri se ilumina
com a diversidade de
loiras morenas meninas
imagens gestos fantasias
toques olhares quermesses
colégios festas de São João!

Essa é a minha cidade
que sempre vem sussurrar:
o canto precisa continuar
porque delira incompleto
nos vacilos de nosso olhar!

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

SE FOSSE VOCÊ





Que camisa escolheria para combinar com as bermudas, meias e chinelos?
Que cores usar, para ser notado, no centro, no horário comercial?

Não vale o apelo às massas, Big Brother, novelas, só você, vendedora favorita, com sua intuição fervorosa, poderá me ajudar.

Sei, tenho todo o tempo do mundo para me debater no espaço vago do provador, enquanto, do alto, o ventilador rosna pra mim, igual um cão policial.

Você não sabe, mas posso estar traumatizado com o novo milênio e suas imagens violentas, sexo, fome, riqueza, luxuria.

Descobri, para meu desespero, que o ventilador sopra, de cima para baixo, projéteis quentes mal-encarados.

Só você pode dizer que cores combinam com uma estação de excessos, sul com sol, sudeste com chuvas, norte destemperado...

Você sabe, o clima anda indeciso e eu me deixo contagiar.

Ponhas-te no meu lugar e verás como falta sentido ao calendário. Programamos viagens de mentirinha nos feriados, para curtir as promessas desfeitas, e os pecados morrem de vergonha diante de nossas culpas.

Se fosse você, com que cara responderia ao telefonema do cobrador?

Como seria teu aceno aos vizinhos, depois dos arrotos ensandecidos da noite que passou?

Você também programa viagens exóticas nas férias, já sabendo que vai bolar “simples e boas” desculpas para justificar por que ficou por aqui?

Ah, se fosse você...

No meu lugar, você passaria a tarde nas lojas, quebraria o tédio das vendedoras, pra despertar seu ódio com a indecisão de tuas escolhas. Deixa eu ver aquele vestido, Puxa, mas que lindo esse detalhe! Nenhuma amiga minha tem igual!

Ficaria horas no provador e diria, para desespero da pobre que te atende, Puxa, hoje sim ganhei a tarde!

No meu lugar, depois de olhar mil coisas, você descartaria boa parte das picuinhas, voltaria para casa com meia dúzia de sacolas, que vão se juntar a centenas de outras, socadas nas prateleiras.

À noite, se engajaria no mutirão de salvação do planeta, enviando mensagens que entopem caixas de e-mails, preocupada que estás com a consciência ambiental...

Se fosse você, simplesmente diria: Agora, sim, é pra valer!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

AMIGAS DOS ESPELHOS




Felizes são as roupas
dos guarda-roupas
que são amigas
das portas
que têm
espelho
do lado
de dentro.

A camisa
vaidosa
toda
manhã
se olha
se enfeita
suspira
de amor
e murmura,
assim:
“Eu me amo
eu me adoro
eu não consigo
viver sem mim!”

E o espelho
do armário
que mora
do lado
de fora
da porta
reclama,
solitário,
delira
e sussurra,
assim:
“Eu me escabelo
e me esfarelo
em mil cacos
porque
ninguém
quando
passa
me chama
me abraça
só me deixa assim
numa espera
sem fim!”

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

OFICINAS LITERÁRIAS





Durante quatro sextas-feiras, do mês de outubro, tivemos oficinas literárias no SESC/Ijuí com o escritor Porto Alegrense Luis Dill. O jovem escritor desponta no cenário nacional com vários livros publicados, principalmente para o público adolescente.

No ano de 2008 venceu o Açorianos de Literatura na categoria CONTOS.

Os que se esforçam no ardoroso desafio da escrita sabem a importância que essas oficinas têm. Uma delas, por exemplo, é superar o medo da crítica do palestrante, e de outros participantes, com relação ao seu texto.

Nesses encontros reforça-se a convicção de que escrever é um ato de corrigir, corrigir e recomeçar, sem a crença de que seu texto está definitivamente pronto. A escrita se resume em tentativas (ensaios) que, algumas vezes, nos satisfazem, outras vezes não. Embora o olhar do leitor é o que mais importa.

Dentre muitas, algumas dicas para os que se aventuram na escrita:

- Levar em conta a participação do leitor. Não dar-lhe o texto mastigado.
- ser um grande crítico de seu próprio trabalho.
- quanto ao binômio inspiração/transpiração, diz Tchecov: “A escrita é que gera inspiração”. Ou como afirma o próprio Dill: “É preciso pensar muito sobre o que se está escrevendo”.
- Outro item fundamental: na narrativa, evitar o uso de clichês e lugares comuns.

domingo, 18 de janeiro de 2009

MARIA


filme - Pequena Miss Sunschine


As esquinas são democráticas. Observam os encontros, com sua discrição habitual. Aqueles motoristas apressados nada vêem, para eles é pequeno demais o intervalo de um sinal verde e outro. Ou se distraem, pressionados pelo horário, ou aguardam, prestam atenção na música que toca, e espiam os visinhos.

Olhares que se trocam. Lance de sorte, acaso, uma “força” maior. Por toda a parte o normal é a morte, a guerra, os nascimentos, o Big-bang.

Burburinhos no palco, canhões de luzes coloridas se espalham. Maria desperta de seu vaivém. Nenhuma sombra de amor nos seus dedos, cobrança demais no trabalho, status que a sugam unhas e dentes.

Clube, piscina, academia, cabeleireiro. Sinal vermelho, e Maria põe-se a pensar, e seu olhar me percebe ao seu lado. Os encontros não podem se aquietar nos burburinhos das esquinas. Uma caneta no porta-luvas. Até que enfim ela se presta para salvar o amor!

Te conheço de algum lugar! Olhos brilham e se movimentam como canhões de luz. As cortinas do vidro do carro se abaixam. Vislumbra-se a paisagem do “por que não?”.

Maria vacila, pondera, põe-se a trabalhar sua razão. Anotou meu telefone na palma da mão. Aquele lugar onde a cartomante, certo dia, percorreu a linha de sua vida e previu vida longa cheia de saúde paz e amor.

Minutos depois se reconforta no seu canto, na cadeira macia e no ar condicionado do escritório. Maria se inquieta e pondera: Metido, quis de imediato meu telefone! Não passa de um Don Juan!

Sinais verdes, amarelos e vermelhos tantas vezes se revezam, e as luzes dos canhões dos olhos do pretendente ficam para trás.

Cotidiano seguro, trabalho, amigos, status, assim a vida segue de bom tamanho.

O PATIFE tá enrolando de novo

Quando fui acertar a conta no bar, pendurada nos últimos dias, o bolicheiro não encontrou, no caderno, o meu nome. Ao repassar a longa l...